“Confrontos”, como o próprio nome indica, é um projeto que pretende destacar o confronto entre a luz, como um elemento rico, através do qual a arquitetura ganha vida, revelando as suas texturas, cores, a forma como é concebida e o jogo com as sombras na ausência da mesma. O que é vazio, o que existe entre as coisas só a luz nos pode mostrar. Na sua ausência, parcial ou não, surge a sombra, que nos questiona sobre os limites da nossa perceção numa atmosfera espacial. Vai variando, ao longo das horas, dos dias, dos meses, ao longo de cada estação. Intensifica o espaço, a forma arquitetónica e a natureza do ambiente. Novas sensações são estimuladas a quem se deixa conduzir por ela, mas isto só é possível graças à luz, que nos permite imaginar para lá do que os nossos olhos conseguem captar através do constante diálogo entre ambas ou até dos próprios reflexos…
A partir da análise do conceito de promenade architecturale desenvolvido pelo arquiteto Le Corbusier, torna-se inegável a valorização do uso da luz e da sombra na arquitetura na criação de experiências e diferentes ambientes para a construção de um itinerário dentro do espaço arquitetónico, dando origem a diferentes percursos, enfiamentos visuais e faces dos volumes e respetivas superfícies. Desta forma, fascina-nos como cada fotografia é uma perspetiva que deixa transparecer a inserção da sombra num determinado espaço, permitindo-nos debruçar sobre as particularidades que ela nos suscita. De facto, há sítios em que as sombras ganham tamanha dimensão que nos levam para um mundo enigmático, podendo se confundir com corpos, com objetos, com naturezas, onde tudo o que se move aparenta projetar uma realidade oculta.
Posto isto, o tema central do presente trabalho trata da relação dos planos e volumes do edifício da FAUP, projetado pelo arquiteto Álvaro Siza Vieira, com a luz e como isso se relaciona com o conceito de promenade. Foi através das nossas fotografias que pudemos explorar o confronto entre a luz, sombra e reflexos com o edificado. Exemplares destas qualidades do uso da luz e da sombra empregue na fotografia destacam-se os trabalhos de Cláudio Reis, Edgar Martins e Paolo Rosselli. Os dois primeiros destacam-se sobretudo pelo aproveitamento dos efeitos da luz e da sombra nos espaços. No caso de Cláudio Reis, aliado ao uso cuidado da perspetiva, bem como enfiamentos visuais e no caso dos projetos do segundo, de Edgar Martins, os mesmos ganham maior dimensão pelo contraste da natureza dos espaços com a escuridão que os rodeia. Paolo Rosselli é conhecido também por trazer para as suas imagens a ideia de sobreposição de planos através de uma única foto, contando com o reflexo de pessoas e o movimento que contrastam com a paisagem. O movimento, a paisagem de fundo e a utilização do reflexo trazem uma ideia de completude à imagem que conta muito sobre o local e o momento em que a fotografia foi tirada.
Em suma, tendo como ponto de partida a análise dos diversos autores e da execução do presente trabalho, tomamos consciência de que a arquitetura transita entre a arte, a rigidez e a poesia, alimentada por confrontos capazes de criar diferentes espaços e interpretações ao longo do trajeto num determinado espaço. Esta atitude, a qual é intitulada promenade, pode ser traduzida através das imagens do presente trabalho. Evocando o pensamento de Corbusier uma vez mais, o próprio afirma no seu livro “Mensagem aos estudantes de Arquitetura” que “a qualidade da circulação interior será a virtude biológica da obra, organização do corpo construído, na verdade ligado à razão de ser do edifício”[2], num último esforço de enunciar a importância do percurso na arquitetura.
[1] CORBUSIER, Le. BOESIGER, W (org). Le Corbusier et Pierre Jeanneret. Oeuvre Complète. Zurich: Lés Éditions
D’Architecture, 1936.
[2] CORBUSIER, Le. Mensagem aos estudantes de arquitetura. Trad. Rejane Janowitzer. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 43