Um mapa para navegantes por Beatriz González Giménez
A fotografia ficou associada, desde a sua origem, à necessidade de representação e de reprodução através da imagem e, ainda mais importante, à necessidade de compreender melhor o mundo que nos rodeia. Daí que, no séc. XIX, a fotografia fosse catalogada como espelho da realidade. Além disso, a sua capacidade de reproduzir o que era fotografado com enorme detalhe, definição e precisão tornou-a numa grande ferramenta científica. Curiosamente, ao mesmo tempo que se elogiava este novo meio pelo respetivo caráter mimético e pela qualidade de ser fiel reflexo da realidade, era questionado, de forma radical, o papel do fotógrafo no processo de criação. Em relação a isso, o crítico francês André Bazin dizia que: «Pela primeira vez, é formada automaticamente uma imagem do mundo exterior sem intervenção criadora por parte do homem».
A célebre frase «Prima o botão, que nós fazemos o resto», vertida em 1888 por George Eastman, anunciava a democratização deste meio. A partir desse momento, deu-se início a um processo a partir do qual qualquer um poderia fazer fotografias, pressupondo o começo do desaparecimento da figura do fotógrafo antes de se cumprir um século desde a sua origem. Já em pleno século XXI, as câmaras dos dispositivos móveis inteligentes ditaram o salto definitivo da fotografia: neste instante, a imensa maioria da população mundial leva uma câmara fotográfica no bolso e, o que é ainda mais significativo, faz uso dela diariamente.
A fotografia é um suporte para a memória que nos permite armazenar facilmente momentos, localizações e panoramas que nos cativam; imagens que podem ser vistas e revistas, imagens que partilhamos, imagens com as quais comunicamos entre nós. De igual modo, a fotografia é uma grande ferramenta para a aprendizagem. Através das imagens, conhecemos outras pessoas, outros lugares, paisagens e estilos de vida. As fotografias são testemunhas dos novos desenvolvimentos e das propostas mais vanguardistas levadas a cabo em qualquer parte do mundo. Por outro lado, a fotografia passou a ser a mais popular expressão artística.
Para um estudante, cuja curiosidade pelo que o rodeia costuma ser evidente, o ato fotográfico constitui uma via para experimentar novos pontos de vista sobre a respetiva envolvente. Graças a isso, uma atividade que pode nascer ou começar por ser entendida como sendo de forma lúdica pode vir a tornar-se numa poderosa ferramenta de análise e de questionamento do objeto ou da envolvente fotografada. Aproveitando essas facilidades da ferramenta, a tarefa dos docentes consiste em expor as possibilidades da fotografia como meio de investigação, de documentação, de crítica ou de expressão pessoal.
Atualmente, os problemas enfrentados por um estudante não estão no acesso à documentação visual, mas, sim, na dificuldade de conseguir uma escolha correta de referências. As enormes quantidades de imagens às quais estamos expostos diariamente fazem com que seja impedida a receção de material de qualidade. E, por isso, os desígnios da proposta curatorial da publicação CONTRAST, que visa facilitar ao leitor uma cuidada seleção de referências visuais e teóricas, são tão acertadas como necessárias.
Um dos objetivos da publicação CONTRAST consiste em servir de ponto de encontro interdisciplinar das principais instituições portuguesas de ensino superior que utilizam a fotografia como um instrumento de expressão e pesquisa para a aprendizagem interdisciplinar, uma ligação entre práticas como a arquitetura, a arte e o desenho, entre outras. A publicação CONTRAST oferece uma cuidada recompilação de textos escritos por professores e investigadores que proporcionam uma substantiva análise crítica, refletindo sobre diversos projetos fotográficos criados num contexto de envolvente de aprendizagem e investigação portuguesa. Além disso, inclui uma recompilação de projetos fotográficos criados por estudantes e selecionados por cada instituição e unidade(s) curricular(s) envolvida(s).
A respetiva publicação pretende contribuir, de maneira decisiva, para o desenvolvimento e a difusão da jovem fotografia portuguesa. Pressupõe, ainda, um notável ímpeto para o reconhecimento da fotografia como linguagem e ferramenta única aquando da aprendizagem em áreas como a arquitetura, arte e design. A sua missão principal é a da criação de sinergias entre as diversas escolas de fotografia, unindo as instituições de ensino superior num projeto comum que visa o reconhecimento internacional.
As iniciativas promovidas a partir do projeto CONTRAST incluem a criação de obras artísticas e a programação de ações específicas para ampliar o alcance das propostas artísticas, envolvendo instituições e comunidades locais e permitindo assim a respetiva participação na difusão e conceção desses projetos. Trata-se, portanto, de uma atividade que pretende abrir as instituições de ensino superior à sociedade de modo a gerar um efeito transformador nos ambientes que as acolhem, recuperando, desse modo, um dos propósitos-chave dessas instituições. As páginas da publicação CONTRAST fornecem um mapa visual de extraordinária qualidade para aqueles navegantes que desejam atravessar, com êxito, as águas que nos torneiam.