A origem da palavra “ilha” ainda não é conhecida, mas sabe-se que a partir do século XVIII a palavra ilha é referida como descrição de uma tipologia arquitectónica tão conhecida na cidade do Porto. No início da Revolução Industrial a população do Porto tinha duplicado. A miséria do campo fez com que milhares de famílias abandonassem o Norte do país rumo à cidade do Porto na esperança de que a indústria moderna lhes melhorasse as condições de vida. Sem dinheiro, estas famílias alugavam pequenas casas com dimensões entre os 9 e os 16 m2 sem água, luz, por vezes sem janelas e com casas de banho comunitárias, que chegavam a ter de servir 25 famílias. Estas casas situam-se nas traseiras de casas burguesas e as rendas eram muito baixas no entanto, numa casa tão pequena viviam famílias com 5, 10 ou 15 elementos.
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Com as epidemias do final do século XIX como a peste bubónica foi necessário pensar em melhorar as condições de higiene dos habitantes da cidade do Porto e foi desde aí que se começou a implementar alternativas de habitação. No entanto é no Estado Novo e sobretudo logo após o 25 de Abril que se verificam essas alternativas, como o caso do Projecto SAAL e a construção do bairro de S. Victor. Os arquitectos da Escola do Porto como Álvaro Siza Vieira projectaram soluções de habitação social no centro do Porto para tentar realojar algumas das famílias que viviam em ilhas.
Nos últimos anos com o crescimento do turismo e com a pressão imobiliária muitas famílias foram obrigadas a abandonar as ilhas e muitas destas transformaram-se em pequenos T0 de luxo com rendas pouco acessíveis. Outras ilhas foram demolidas e muito poucas foram recuperadas para continuarem a alojar as mesmas famílias.
Apesar das fracas condições de vida nas ilhas a ideia de comunidade está muito presente, e muitas vezes estas pessoas têm o que costumam dizer a “família de sangue” e a “família da rua”.
O projecto fotográfico desenvolvido entre finais de Outubro e inícios de Dezembro é um retrato de vivências de diferentes pessoas residentes em ilhas situadas nas traseiras da minha casa. Numa pesquisa pelo Arquivo Municipal do Porto é provável que estas ilhas que vejo tivessem sido construídas para albergar os operários da Fábrica de Curtumes da Póvoa, situada na Rua da Póvoa, que agora se encontra em ruína. Estas ilhas não seguem a tipologia clássica e algumas das casas sofreram mudanças ao longo dos anos, foram alongadas ou construídos anexos.
As fotografias foram tiradas a partir da varanda da minha casa com uma teleobjectiva e uma câmara analógica. Como o prédio onde resido se situa numa zona mais alta do que as ilhas as fotografias são em grande parte planos picados. Por outro lado isto fez com que as fotografias fossem mais anónimas, isto é, as fotografias foram tiradas sem o conhecimento e a percepção das pessoas. Ao longo destes dois meses fui tirando fotografias em dias de sol, chuva, dias da semana e fins de semana. É curioso que a partir de um projecto fotográfico se fique a conhecer rotinas de pessoas que não se conhece. Nos dias de sol há sempre roupa estendida a secar, aos fins de semana vê-se mais pessoas à porta das suas casas a conversar, durante a semana entre as 8h45 e as 9h da manhã os pais e mães levam os filhos à escola de mãos dadas, e nos dias de chuva quase não se vê pessoas e apenas ficam nos estendais algumas peças de roupa que não se conseguiu tirar antes da chuva. Este projecto é então um retrato não só das vivências destas famílias em particular mas também um retrato de algo que é tão característico da cidade do Porto e que aos poucos se está a transformar.